segunda-feira, 30 de maio de 2016

INOCÊNCIA - VISCONDE DE TAUNAY - ANÁLISE DO ROMANCE

No romance Inocência, além do drama amoroso vivido pela protagonista e Cirino, há também a descrição exata e minuciosa da natureza do sertão, do sertanejo e de seus costumes.
·         CARACTERÍSTICAS ROMÂNTICAS PRESENTES NA OBRA
1.    Presença da natureza: traço pertinente na estética romântica, a natureza atua como pano de fundo na narrativa, agindo também como reflexo dos sentimentos e sensações vividos pelos personagens. A natureza, no romance, funciona como mais um elemento na descrição fiel do ambiente sertanejo.
“ Ora é a perspectiva dos cerrados, não desses cerrados de arbustos raquíticos, enfezados e retorcidos de São Paulo e Minas Gerais, mas de garbosas e elevadas árvores que, se bem não tomem, todas, o corpo de que são capazes à beira das águas correntes ou regadas pela linfa dos córregos, contudo ensombram com folhuda rama o terreno que lhes fica em derredor e mostram na casca lisa a força da seiva que as alimenta ( …)”

2.    Impossibilidade amorosa: outra característica própria do Romantismo é o amor repleto de obstáculos ou impossível entre os amantes.
Inocência, quando conhece e se apaixona por Cirino, já está comprometida com um homem escolhido por seu pai.
Cirino e Inocência pertencem a mundos diferentes. Ele advindo do mundo urbano, aberto ao novo, e ela criada no mundo do sertão, presa aos costumes rígidos, à palavra dada, à inferiorização da mulher.
Essa diferença entre os mundos também impossibilita o amor entre os personagens.

3.    Sofrimento amoroso: é próprio do Romantismo sofrer por amor, principalmente diante da impossibilidade de os amantes viverem esse amor.
“ – Sim… você que é uma mulher como nunca vi… Seus olhos me queimaram… Sinto fogo dentro de mim… Já não vivo… o que só quero é vê-la… é amá-la, não conheço mais o que seja sono e, nesta semana, fiquei mais velho do que em muitos anos havia de ficar… E tudo, por quê, Inocência?
- Eu não sei, não, respondeu a pobrezinha com ingenuidade.
- Porque eu amo… amo-a, e sofro como um louco… como um perdido.”

4.    Idealização amorosa: a noção de que os amantes só serão felizes quando concretizarem seu amor. Essa concretização poderá acontecer nessa vida ou após a morte.



“ (…) Se eu me finasse e mecê também, punha-se a minha alma a correr pelos ares, procurando a de mecê, procurando, procurando, e então nós dois, juntinhos íamos Tiago, às vezes baixando a este ermo a ver onde é que botaram os nossos corpos… Não era tão bom?”

5.    Primeiro e único amor:
“ (…) Sou um rapaz de bons costumes… Até hoje nunca tinha amado mulher alguma… mas não sei como deixar de amar uma moça como você…"

6.    Religiosidade:
“ – Nossa Senhora da abadia, implorava ele puxando os cabelos com desespero, valei-me neste apuro em que me acho! Dai-me pelo menos esperanças de que aquela menina poderá um dia querer-me bem… Nada mais desejo… Possa o fogo que me consome abrasar também o seu peito…”

·         MUNDO RURAL X MUNDO URBANO
A narrativa estabelece a difícil convivência de personagens pertencentes aos dois mundos: o rural e o urbano.
Pereira, pai de Inocência, é o representante do mundo sertanejo. Tal mundo é caracterizado pela rigidez dos costumes, pela obediência à palavra dada e pela visão estigmatizada das mulheres.
O alemão Meyer, pesquisador de borboletas, representa o mundo urbano, científico e de costumes menos rígidos.
A dificuldade de interação entre os dois personagens surge quando Meyer, inadvertidamente, tece comentários sobre a beleza de Inocência. Pereira considera esses elogios como desrespeitosos e acaba por criar uma enorme antipatia pelo alemão.
“ Se, de um lado, criava involuntária admiração por Meyer e, rodeando-o, em sua imaginação, do prestígio de uma beleza irresistível, via aumentar o seu receio em abrigar tão perigoso sedutor; do outro, sentia as mãos presas pelas obrigações imperiosas da hospitalidade, a qual, com a recomendação expressa de seu irmão mais velho, assumia caráter quase sagrado. Juntem-se a isto os preconceitos sobre o recato doméstico, a responsabilidade de vedar o santuário da família aos olhos de todos, o amor extremoso à filha, em quem não depositava, contudo, como mulher que era, confiança alguma, as suposições logo ideadas acerca da impressão que naturalmente aquele estrangeiro produzira no coração da sua Inocência, já quase pertencendo ela a outrem, e as colisões que previu para manter inabalável a sua palavra de honra, palavra dada em dois sentidos agora antagônicos – um mundo enfim de cogitações e de terrores. E tudo isto revolvendo-se na cabeça de Pereira, refletia-se com sombrios traços de inquietação em seu rosto habitualmente tão jovial”.

Meyer, por outro lado, não percebe sua inconveniência em relação aos costumes seguidos por Pereira e continua elogiando e comentando sobre a filha do sertanejo.
“ – Aqui, no sertão do Brasil, há o mau costume de esconder as mulheres. Viajante não sabe de todo se são bonitas, se feias, e nada pode contar nos livros para o conhecimento dos que leem. Mas, palavra de honra, Sr. Pereira, se todas se parecessem com esta sua filha, é coisa muito e muito digna de ser vista e escrita! Eu…”
Cirino é o único que transita entre os dois mundos. Como possui alguma instrução, tendo frequentado uma importante instituição de sua cidade, Cirino é um representante do mundo urbano.
Entretanto, “devido às suas origens e também à sua atual profissão, tem vínculos também com o mundo rural”.
Mesmo transitando nos dois mundos, Cirino não concorda com determinados costumes e opiniões do sertanejo.
O pensamento de Cirino sobre as mulheres é totalmente divergente da opinião preconceituosa de Pereira, demonstrando, assim, os contrastes entre os dois mundos.
“ – Sr. Pereira, replicou Cirino com calma, já lhe disse e torno-lhe a dizer que, como médico, estou há muito tempo acostumado a lidar com famílias e a respeitá-las. É este meu dever, e até hoje, graças a Deus, minha fama é boa… Quanto às mulheres, não tenho as suas opiniões, nem as acho razoáveis nem de justiça. (…) O senhor falou-me com toda franqueza, e também com franqueza lhe quero responder. No meu parecer, as mulheres são tão boas como nós, se não melhores: não há, pois, motivo para tanto desconfiar delas e ter os homens em tão boa conta… Enfim, essas suas ideias podem quadrar-lhe à vontade, e é costume meu antigo a ninguém contrariar, para viver bem com todos e deles merecer o tratamento que julgo ter direito a receber.”

·         LINGUAGEM
Diferente do que ocorre no romance A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães, em que há a predominância da linguagem culta, erudita, aparecendo, raras vezes, registros de um falar próprio dos escravos, no romance Inocência “as falas dos personagens trazem expressões locais pitorescas, demonstrando o esforço de registro linguístico”.
As expressões e ditos populares são explicados pelo autor através de notas de rodapé.
O narrador, entretanto, coloca-se distante desse discurso coloquial, assumindo “sua condição de produto cultural erudito e elevado”.
“ – Vassuncê não credita! Protesta então com calor. Pois encilhe o seu bicho e caminhe como eu lhe disser. Mas assunte bem, que no terceiro dia de viagem ficará decidido quem é cavouqueiro e embromador. Uma coisa é mapiar à toa, outra andar com tento por estes mundos de Cristo”.

·         NARRADOR
O narrador da obra é onisciente e apresenta algumas opiniões a respeito dos costumes e hábitos dos sertanejos.
Há uma grave crítica do autor ao patriarcalismo do sertanejo e essa crítica aparece nos comentários do narrador.
“ Esta opinião injuriosa sobre as mulheres é, em geral, corrente nos nossos sertões e traz como consequência imediata e prática, além da rigorosa clausura em que são mantidas, não só o casamento convencionado entre parentes muito chegados para filhos de menor idade, mas sobretudo os numerosos crimes cometidos, mal se suspeita possibilidade de qualquer intriga amorosa entre pessoa da família e algum estranho.”

·         AUSÊNCIA DE IDEALIZAÇÃO EM ALGUNS ASPECTOS
O sertanejo é descrito no romance de maneira menos idealizada, sendo ressaltada sua visão deturpada da figura feminina, seus costumes rígidos.
Do mesmo modo, os amantes Inocência e Cirino também são apresentados na narrativa como possuidores de virtudes e de vícios.
Inocência é imensamente bela, porém, graças à educação recebida do pai, foi impedida de estudar, não sabendo ler e escrever.
A protagonista do romance A Escrava Isaura, apesar de sua condição de cativa e vivendo em uma sociedade igualmente patriarcal, possuía uma educação invejável. Isaura aprendeu várias línguas, teve conhecimentos sobre Arte, Música, bem como os afazeres domésticos, confirmando o aspecto idealizado de seu personagem.
Taunay decidiu deixar um pouco de lado a idealização para construir personagens mais verossímeis.
Cirino, do mesmo modo, também não é exemplo de idealização romântica. Estudou farmácia e se autopromoveu médico. Precisava curar doentes pelo sertão, pois com o dinheiro recebido poderia pagar uma grande dívida de jogo.
“ Curandeiro, simples curandeiro, ia por toda a parte granjeando o tratamento de doutor, que gradualmente lhe foi parecendo, a si próprio, título inerente à sua pessoa e a que tinha incontestável direito.
Bem formado era o coração daquele moço, sua alma elevada e incapaz de pensamentos menos indignos; entretanto no íntimo de seu caráter se haviam insensivelmente enraizado certos hábitos de orgulho, repassado de tal ou qual charlatanismo, oriundo não só da flagrante insuficiência científica, como da roda em que sempre vivera”.

·         A FIGURA DA MULHER NO ROMANCE
A mulher é vista no romance como responsável por todos os infortúnios dos homens, sendo tratada como sedutora e incitadora dos seus maus comportamentos.
“ – E mulher, prosseguiu o mineiro com raivosa volubilidade, é gente tão levada da breca, que se lambe toda de gosto com ditinhos e requebros desta súcia de embromadores. Com elas, digo eu sempre, não há que fiar… Má hora me trouxe este alamão…”
Essa visão inferiorizada da mulher pode ser observada nos arranjos matrimoniais. Enquanto no romance Senhora, de José de Alencar, o casamento é visto como meio de ascensão social, através do uso do dote e, por esse motivo, criticado na obra.
O casamento, em Inocência, é a única saída para as famílias preocupadas com a reputação de suas filhas.
As mulheres, de acordo com o costume sertanejo, não têm o direito de escolher seus maridos, cabendo ao pai essa função.
Desse modo, Taunay nos mostra que o casamento mantém a mulher sempre subordinada ao homem, saindo da dominação do pai para submeter-se ao marido.
“ – E o que nos importa isso? Uma menina como ela não sabe o que lhe fica bem ou mal… Ninguém a vai consultar. Mulheres, o que querem é casar. Não ouviu já o patrício dizer que elas não casam com carrapato, porque não sabem qual é o macho?”
Além de não poder escolher seu marido, a mulher também não tinha direito à educação.
Inocência não sabia ler e escrever, pois sua única obrigação era cuidar da casa, do marido e dos filhos.
“ (…) Mulher é para viver muito quietinha perto do tear, tratar dos filhos e cria-los no temor de Deus; não é nem para parolar-se com ela, nem a respeito dela”.
A personagem possui o desejo de ler, mas é logo tolhida por Pereira, seu pai.
“(…) Pois não é que um belo dia ela me pediu que lhe ensinasse a ler?… Que ideia! Ainda há pouco tempo me disse que quisera ter nascido princesa… Eu lhe retruquei: e sabe você o que é ser princesa? Sei, me secundou ela com toda clareza, é uma moça muito boa, muito bonita, que tem uma coroa de diamantes na cabeça, muitos lavrados no pescoço e que manda nos homens… Fiquei meio tonto”.
De acordo com o fragmento acima, Inocência expressava o desejo, talvez de muitas mulheres da época, de livrar-se da dominação masculina.

·         BIBLIOGRAFIA
BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. São Paulo, Cultrix, 36ª edição,1999.
TAUNAY, Visconde de. Inocência. São Paulo, Ática, 30ª edição, 2011.
educação.globo.com/literatura/assunto/resumos-de-livros/inocência.html










sábado, 28 de maio de 2016

A ESCRAVA ISAURA - Atividades referentes ao Romance

TEXTO 01
“Leôncio achara desde a infância nas larguezas e facilidades de seus pais amplos meios de corromper o coração e extraviar a inteligência. Mau aluno e criança incorrigível, turbulento e insubordinado, andou de colégio em colégio e passou como   gato por brasas por cima de todos os preparatórios, cujos exames, todavia, sempre salvara à sombra do patronato. Os mestres não se atreviam a dar ao nobre e munífico comendador o desgosto de ver seu filho reprovado. Matriculado na escola de medicina logo no primeiro ano enjoou-se daquela disciplina, e como seus pais não sabiam contrariá-lo, foi para Olinda a fim de frequentar o curso jurídico. Ali, depois de ter dissipado não pequena porção da fortuna paterna na satisfação de todos os seus vícios e loucas fantasias, tomou tédio também aos estudos jurídicos e ficou entendendo que só na Europa poderia desenvolver dignamente a sua inteligência e saciar a sua sede de saber, em puros e abundantes mananciais. Assim escreveu ao pai, que deu-lhe crédito e o enviou a Paris, donde esperava vê-lo voltar feito um novo Humboldt. Instalado naquele vasto pandemônio do luxo e dos prazeres, Leôncio, raras vezes, e só por desfastio, ia ouvir as eloquentes preleções dos exímios professores da época e nem tampouco era visto nos museus, institutos e bibliotecas. Em compensação era assíduo frequentador do Jardim Mabile, assim como de todos os cafés e teatros mais em voga, e tornara-se um dos mais afamados e elegantes leões dos bulevares”.
GUIMARÃES, Bernardo. A Escrava Isaura. São Paulo, Editora Ática, 17ª edição,1991.

01.  O tema do texto é:
A)   A descrição do caráter de Leôncio, tomando como exemplo sua conduta quando criança e adolescente.
B)   A maneira eficaz dos pais educarem seu filho único, não esquecendo de repassar a ele valores como ética, nacionalismo, amor aos pais.
C)   A situação precária do ensino no país que forçou os pais de Leôncio a patrocinarem seus estudos em Paris.
D)   A preocupação dos pais de Leôncio em relação a sua educação, primando sempre por boas universidades e professores de excelência.
E)   A triste situação de Leôncio que, desde cedo, teve que se separar dos pais para estudar fora do país.

02.  Em “(…) andou de colégio em colégio e passou como gato por brasas por cima de todos os preparatórios (…)”, a expressão destacada tem o sentido de:
A)   Passou, com muito esmero, por cima de todos os preparatórios.
B)   Passou, conforme a maioria dos alunos, por cima de todos os preparatórios.
C)   Passou, de maneira abrupta, por cima de todos os preparatórios.
D)   Passou, de maneira superficial, por cima de todos os preparatórios.
E)   Passou, de modo discreto, por cima de todos os preparatórios.

03.  O trecho “(…)Leôncio, raras vezes, e só por desfastio, ia ouvir as eloquentes preleções dos exímios professores da época e nem tampouco era visto nos museus, institutos e bibliotecas.” refere-se:
A)   À falta de interesse de Leôncio no que diz respeito aos estudos e ao conhecimento.
B)   Á necessidade que Leôncio tinha em ouvir as palestras de seus professores.
C)  Ao excesso de confiança de Leôncio em seus conhecimentos, acreditando não seu necessária tanta dedicação.
D)   Ao fato de Leôncio não entender as aulas ministradas e preferir afastar-se do ambiente acadêmico.
E)  Ao número excessivo de vezes que Leôncio era visto nos ambientes culturais da cidade.

TEXTO 02
“Mas essa tal ou qual tranquilidade só durou até o dia em que, pela primeira vez, viu Álvaro. Amou-o com esse amor exaltado das almas elevadas que amam pela primeira e única vez e esse amor, como bem se compreende, veio tornar ainda mais crítica e angustiosa a sua já tão precária e mísera situação”.
GUIMARÃES, Bernardo. A Escrava Isaura. São Paulo, Editora Ática, 17ª edição,1991.

04.  O tema do fragmento citado é típico do Romantismo Brasileiro, configurando uma forte característica dos heróis e heroínas dessa escola literária. O fundamento dessa característica é:
A)   A angústia causada pela ausência do verdadeiro amor.
B)   A certeza de que o verdadeiro amor não acentua os obstáculos que a vida oferece.
C)   A crença no amor à primeira vista e na singularidade desse acontecimento.
D)   A tranquilidade resultante da certeza de sentir-se amado.
E)   O alívio causado pela descoberta do primeiro amor.

TEXTO 03
“- Tu o disseste, Geraldo, amo-a muito, e hei de amá-la sempre, nem disso faço mistério algum. E será coisa estranha ou vergonhosa amar-se uma escrava? O patriarca Abraão amou sua escrava Agar, e por ela abandonou Sara, sua mulher. A humildade de sua condição não pode despojar Isaura da cândida e brilhante auréola de que a via e até hoje a vejo circundada. A beleza e a inocência são astros que mais refulgem quando engolfados na profunda escuridão do infortúnio.
- É bela a tua filosofia e digna de teu nobre coração, mas que queres? As leis civis, as convenções sociais, são obras do homem, imperfeitas, injustas e, muitas vezes, cruéis. O anjo padece e geme sob o jogo da escravidão, e o demônio exalça-se ao fastígio da fortuna e do poder”.
GUIMARÃES, Bernardo. A Escrava Isaura. São Paulo, Editora Ática, 17ª edição,1991.

05.  Ao utilizar-se em seu argumento o exemplo bíblico da patriarca Abraão, que abandonou sua esposa Sara pelo amor da escrava Agar, Álvaro pretende:
A)   Convencer seu amigo Geraldo de que não é loucura todo o amor devotado a Isaura.
B)  Defender a tese de que a beleza de Isaura é enaltecida graças a sua condição de escrava.
C) Explicar ao amigo que o infortúnio da escravidão sempre serviu de obstáculo aos amantes.
D)   Mostrar que a condição de escrava de sua amada aguça a ambição de seu senhor.
E)   Ressaltar que seu amor é proibido e praticamente impossível aos olhos de Deus e dos homens.

06.  Geraldo reflete sobre a condição de escrava de Isaura. Qual o ponto de vista do amigo de Álvaro?

 TEXTO 04
“ – Não gosto que a cantes, não, Isaura. Hão de pensar que és maltratada, que és uma escrava infeliz, vítima de senhores bárbaros e cruéis. Entretanto, passas aqui uma vida que faria inveja a muita gente livre. Gozas da estima de teus senhores. Deram-te uma educação como não tiveram muitas ricas e ilustres damas que eu conheço. És formosa e tens uma cor linda, que ninguém dirá que gira em tuas veias uma gota de sangue africano. Bem sabes quanto minha boa sogra antes de expirar te recomendava a mim e a meu marido. Hei de respeitar sempre as recomendações daquela santa mulher, e tu bem vês, sou mais tua amiga do que tua senhora. Oh! Não, não cabe em tua boca essa cantiga lastimosa, que tanto gostas de cantar. – Não quero – continuou em tom de branda repreensão – não quero que a cantes mais, ouviste Isaura? … se não fecho-te o meu piano”.

GUIMARÃES, Bernardo. A Escrava Isaura. São Paulo, Editora Ática, 17ª edição,1991

TEXTO 05


07.  No texto 04, Malvina se aborrece com a triste canção, que fala sobre o infortúnio da escravidão, cantada por Isaura. De acordo com o texto, Malvina:
A)  Concorda com a tristeza de Isaura, porém adverte a pobre escrava de que sua condição é bem melhor que a de outras escravas.
B)  Considera que não há a necessidade de libertar Isaura, pois a família já dedica a ela uma educação digna das grandes damas da sociedade.
C)   Destaca que a beleza de Isaura encontra-se na sua ascendência negra e que a moça deveria alegrar-se com o tratamento dedicado a ela.
D)  Mostra que Isaura deve sentir-se feliz, visto que é tratada como qualquer moça da sociedade.
E)   Reflete sobre a situação da mulher escrava no Brasil, bem como critica o preconceito racial existente.

08.  Destaque do texto 04 a passagem que reproduz uma visão preconceituosa em relação ao negro.

09.  No texto 05, a personagem Susanita expressa duas opiniões sobre preconceito racial. Indique essas duas opiniões e em qual delas Susanita realmente acredita.

10.  A personagem Susanita, do texto 05, bem como Malvina, no texto 04, expressam uma visão preconceituosa em relação ao negro. O problema da intolerância racial ainda é comum, nos dias de hoje, e atinge todas as classes sociais. Temos como exemplo atores, apresentadores, pessoas públicas em geral que sofrem injúrias raciais, através de postagens em suas redes sociais. Diante desse triste quadro, o que a sociedade ou o governo podem fazer para extinguir esse preconceito? Estabeleça ações, proponha soluções para o problema.

GABARITO
01.  A
02.  D
03.  A
04.  C
05.  A
06.  Geraldo acredita que as leis e as convenções sociais são obras do homem e, por esse motivo, são imperfeitas, injustas e cruéis. De acordo com ele, Isaura sofre com a sua condição de cativa e seu senhor, Leôncio, aproveita-se da situação para utilizar-se de seu poder e dinheiro para fortalecer seu domínio.
07.  D
08.  “És formosa e tens uma cor linda, que ninguém dirá que gira em tuas veias uma só gota de sangue africano”.
09.  Primeira opinião: Susanita não tem preconceito racial por acreditar que todos são iguais.
Segunda opinião: Susanita sai rapidamente para lavar o dedo após pegar no boneco, indicando que tem, sim, preconceito racial.
Na verdade, Susanita expressa na tirinha que possui, sim, preconceito.




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sexta-feira, 27 de maio de 2016

A ESCRAVA ISAURA - Resumo da obra

http://brasilescola.uol.com.br/literatura/a-escrava-isaura.htm

Em uma magnífica fazenda, no município de Campos de Goitacases, havia uma linda jovem chamada Isaura.
De uma beleza singular, Isaura possuía a pele branca, longos cabelos negros e fortemente ondulados, porém era escrava, e esse fato fazia com que a moça, frequentemente, entoasse tristes canções sobre o cativeiro.
A mãe de Isaura, Juliana, era uma linda mulata, que logo foi alvo dos assédios de seu proprietário, o Comendador Almeida. Entretanto, a pobre escrava não aceitou as investidas de seu dono e foi vítima de duros trabalhos e castigos constantes.
Todavia, no meio de tanto sofrimento, recebeu Juliana ajuda do feitor Miguel, por quem se apaixonou e deu à luz a uma linda criança: Isaura. Devido a todo o sofrimento e duros trabalhos, Juliana morre, deixando a filha órfã.
Ao ver a linda criança, a esposa do Comendador encantou-se e decidiu cuidar da menina como se fosse sua filha. Deu-lhe educação, carinho, mas não alforriou a jovem, com medo de perdê-la de vez. Sempre disse a Isaura que deixaria em seu testamento uma cláusula em que libertaria a escrava.
O comendador e sua esposa tinha um único filho, Leôncio. Um rapaz de gênio difícil, acostumado a boa vida e a ter tudo que queria. Viu no casamento com Malvina “o meio mais suave e natural de adquirir fortuna” e, por esse motivo, casou-se rapidamente com ela.
Após seu casamento com Malvina, vai morar na fazenda e lá passa a observar e cobiçar Isaura. Tenta de todas as formas conquistar a jovem, porém sem sucesso algum.
A mãe de Leôncio morre e Malvina passa a cobrar do marido que se faça cumprir o último desejo de sua mãe, mas Leôncio está obcecado por Isaura e rejeita de todas as formas desfazer-se da escrava.
Um dia, o pai de Isaura, Miguel, aparece na fazenda com uma boa quantia em dinheiro a fim de comprar a liberdade de sua filha, mas Leôncio se vale da sorte, já que recebe a notícia da morte de seu pai, e cancela a venda da escrava que tanto deseja.
Vendo que não haveria saída, Miguel decide fugir com sua filha e vão para Recife, onde mudam seus nomes, passando a chamarem-se Anselmo e Elvira, e tentam ter uma vida bastante reclusa, longe da curiosidade da vizinhança. No entanto, a beleza de Isaura jamais passaria despercebida, e o jovem Álvaro, “senhor de uma fortuna de cerca de dois mil contos”, apaixona-se por Isaura desde o primeiro momento em que a vê.
Enquanto isso, Leôncio, inconformado com a fuga de Isaura, espalha panfletos por vários jornais, oferecendo uma boa recompensa por informações acerca do paradeiro de sua propriedade. E, graças a esses panfletos, Isaura é desmascarada na cidade e devolvida ao seu senhor.
Já na fazenda, Leôncio resolve, num último ato de crueldade, casar Isaura com o jardineiro da fazenda, um homem de aspecto deformado e repulsivo. Acreditando que jamais veria Álvaro novamente, Isaura aceita esse casamento.

No momento em que todos estão reunidos para a celebração, aparece Álvaro. Ele logo explica que dedicou todo o seu tempo para conseguir a liberdade de Isaura e, para isso, decidiu investigar os negócios de Leôncio, descobrindo que o cruel senhor possuía muitas dívidas. O jovem apaixonado comprou todos os créditos de seu adversário e passou a ser o senhor de todas as propriedades de Leôncio, incluindo Isaura. Diante da triste realidade em que se encontrava, Leôncio corre para um quarto próximo e lá dá um tiro em sua cabeça.

segunda-feira, 23 de maio de 2016

A ESCRAVA ISAURA - BERNARDO GUIMARÃES - Análise do Romance

ANÁLISE DO ROMANCE “A ESCRAVA ISAURA” DE BERNARDO GUIMARÃES
NARRADOR
- 3ª pessoa, onisciente;
- promove diálogos com o leitor:
“Dir-me-ão que, sendo Isaura uma escrava, Leôncio, para achar-se a sós com ela, não precisava de semelhantes subterfúgios, e nada mais tinha a fazer do que manda-la trazer à sua presença por bem ou por mal.” (P.51)
“Já são passados mais de dois meses depois da fuga de Isaura e agora, leitores, enquanto Leôncio emprega diligências extraordinárias e meios extremos(…)” (P. 56)
- utiliza-se do recurso do flash-back para melhor explicar os acontecimentos:
“Não pense o leitor que já se acha terminado o baile a que estávamos assistindo. A pequena digressão, que por fora dele fizemos no capítulo antecedente, nos pareceu necessária para explicar por que conjunto de circunstâncias fatais a nossa heroína, sendo uma escrava, foi impelida a tomar a audaciosa resolução de apresentar-se em um esplêndido e aristocrático sarau(…)” (P. 75)

PERSONAGENS
O romance A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães, possui personagens considerados planos, ou seja, durante toda a narrativa, nenhum deles sofre mudanças em seus comportamentos. Seus personagens permanecem com as mesmas virtudes e vícios ao longo de todo o romance.
No livro, a protagonista é, do início ao fim da narrativa, uma moça simples, bem educada, submissa e conformada com sua condição de escrava. Seu grande amor, Álvaro, também atua como Isaura: homem rico e detentor das maiores virtudes do início ao fim do romance.
Esse procedimento utilizado pelo autor na criação de seus personagens faz com que o leitor não tenha surpresas no decorrer da leitura.
O mesmo não acontece nos romances de outro escritor romântico: José de Alencar. No romance Senhora, por exemplo, a heroína Aurélia Camargo, moça simples e crente no amor idealizado, transforma-se em uma mulher milionária, dura e descrente no amor desinteressado. Do mesmo modo, Fernando Seixas também sofre mudanças de comportamento, passando de um homem ambicioso, adepto do dinheiro fácil a um homem que valoriza o amor e o trabalho.
Desse modo, o leitor dos romances de Alencar surpreende-se com o desenrolar da trama e com as mudanças ocorridas em seus personagens principais.
Vejamos agora alguns dos personagens do romance A Escrava Isaura:
01) ISAURA: “bela e nobre figura de moça”. Cabelos negros, pele branca. “O colo donoso e do mais puro lavor sustenta com graça inefável o busto maravilhoso. Vestia-se com simplicidade, usando “uma pequena cruz de azeviche presa ao pescoço por uma fita preta”. Fora criada pela mãe de Leôncio como filha e recebera dela uma educação digna de uma moça da sociedade. Tinha 17 anos.

02) LEÔNCIO: único filho do Comendador Almeida. Dava preferência aos hábitos da devassidão e libertinagem em detrimento aos estudos e ao trabalho. Retrato fiel do que se conhece de um patriarca imperialista. Via no casamento “o meio mais suave e natural de adquirir fortuna”. Apenas depois de casado, interessa-se por Isaura, nutrindo por ela um sentimento tão forte, capaz de tudo para tê-la consigo. “- pensava ele – Isaura era propriedade sua, e quando nenhum outro meio fosse eficaz, restava-lhe o emprego da violência. Leôncio era um digno herdeiro de todos os maus instintos e da brutal devassidão do comendador”.

03) ÁLVARO: tinha 25 anos, órfão de pai e mãe e herdeiro de uma grande fortuna. “(…)era de estatura regular, esbelto, bem feito e belo, mais pela nobre e simpática expressão da fisionomia do que pelos traços físicos”. Não concordava com as distinções sociais bem como com os privilégios dados àqueles mais abastados financeiramente. Era liberal, republicano, “quase socialista” e abolicionista. Libertou todos os escravos que recebeu como herança e organizou para eles uma colônia em suas fazendas. “A fazenda lhes era dada para cultivar, a título de arrendamento, e eles sujeitando-se a uma espécie de disciplina comum, não só preservavam-se de entregar-se à ociosidade, ao vício e ao crime, tinham segura a subsistência e podiam adquirir algum pecúlio, como também poderiam indenizar Álvaro do sacrifício que fizera com sua emancipação”. (p. 63)
Amava também o luxo, os prazeres, a elegância e as mulheres. Dedicava às mulheres um sentimento puro, ideal, próprio do homem romântico.
“(…) não deixava de amar os prazeres, o luxo, a elegância e, sobretudo, as mulheres, mas com certo platonismo delicado, certa pureza ideal, próprios das almas elevadas e dos corações bem formados. Entretanto, Álvaro não havia encontrado até ali a mulher que lhe devia tocar o coração, a encarnação do tipo ideal que lhe sorria nos sonhos vagos de sua poética imaginação”. (p.63)

04) MALVINA: esposa de Leôncio. Moça rica, encantadora, com grandes e meigos olhos azuis. Já estava destinada a casar-se com Leôncio graças ao acordo estabelecido entre as famílias. Apieda-se da condição de Isaura e decide pedir a Leôncio a liberdade da escrava. Descobre que seu marido se interessa por Isaura e decide sair de casa, pois Leôncio não aceita desfazer-se da escrava. Malvina passa a ver Isaura como culpada das investidas de seu marido graças às mentiras de Leôncio e Rosa.

05) MÃE DE LEÔNCIO: uma senhora boa e respeitável que sofre com um casamento infeliz. Seu marido era adepto da libertinagem e da devassidão. Viu no nascimento de Isaura um consolo das angústias de sua vida infeliz. Criou e educou Isaura como filha. Temia que Isaura fosse embora e, por isso, não lhe deu a liberdade. Entretanto, jurou que colocaria esse pedido em seu testamento. Adoeceu e morreu antes que pudesse realizar esse derradeiro desejo.

06) COMENDADOR ALMEIDA: pai de Leôncio. Homem frio e péssimo marido. Interessa-se por uma negra chamada Juliana. Cansado de assediar a escrava e não obter êxito, condena a pobre escrava a trabalhar pesado na lavoura. Após a escrava apaixonar-se pelo feitor Miguel e ter uma filha dele, o comendador aumenta a intensidade dos trabalhos destinados à escrava e acaba matando Juliana. Ao morrer, o comendador deixa toa sua riqueza, bem como suas dívidas, ao filho.

07) MIGUEL: feitor português e pai de Isaura. Faz de tudo para obter a liberdade da filha. Ao perceber que Leôncio jamais desistirá de Isaura, resolve fugir com a filha para Recife. É lá que Isaura conhece e apaixona-se por Álvaro.

08) ROSA: escrava de Leôncio. Não gostava de Isaura por acreditar ser ela a responsável pelo fim de seu relacionamento com Leôncio.

TEMPO
“Era nos primeiros anos do reinado do Sr. D. Pedro II”. (p. 09)

ESPAÇO
“No fértil e opulento município de Campos de Goitacases, à margem do Paraíba, a pouca distância da vila de Campos, havia uma linda e magnífica fazenda”. (p.09)
Este município foi um dos centros da economia escravagista do Sudeste.

ASPECTOS ROMÂNTICOS NA OBRA
A caracterização de Isaura como uma moça linda, a mais bonita dentre todas as moças da região, já é uma forte característica romântica, que se vale intensamente da idealização de seus personagens.
A impossibilidade amorosa, outra característica do Romantismo, encontra-se na triste condição de escrava de Isaura. Por ser cativa, a heroína tem consciência de que não poderá amar ninguém. Além disso, o amor entre Isaura e Álvaro ficará comprometido graças a Leôncio e seu sentimento de proprietário até mesmo dos sentimentos de sua escrava.
Há também, no romance, a noção de primeiro e único amor, como no trecho abaixo:
“Amou-o com esse amor exaltado das almas elevadas que amam pela primeira e única vez, e esse amor, como bem se compreende, veio tornar ainda mais crítica e angustiosa a sua já tão precária e mísera situação.” (P. 70)

A LUTA CONTRA A ESCRAVIDÃO
No romance, a crítica contra o regime escravocrata se faz presente em algumas falas de seus personagens, como por exemplo no diálogo travado entre Álvaro e seu amigo Geraldo:
“- Infame e cruel direito é esse, meu caro Geraldo. É já um escárnio dar-se o nome de direito a uma instituição bárbara, contra a qual protestam altamente a civilização, a moral e a religião. Porém, tolerar a sociedade que um senhor tirano e brutal, levado por motivos infames e vergonhosos, tenha o direito de torturar uma frágil e inocente criatura, só porque teve a desdita de nascer escrava, é o requinte da celeradez e da abominação.
- Não é tanto assim, meu caro Álvaro; esses excessos e abusos devem ser coibidos, mas como poderá a justiça ou o poder público devassar o interior do lar doméstico e ingerir-se no governo da casa do cidadão? Que abomináveis e hediondos mistérios a que a escravidão dá lugar não se passam por esses engenhos e fazendas, sem que, já não digo a justiça, mas nem mesmo os vizinhos deles tenham conhecimento? … Enquanto houver escravidão hão de se dar desses exemplos. Uma instituição má produz uma infinidade de abusos que só poderão ser extintos, cortando-se o mal pela raiz.” (P.92)
Nesse outro trecho, Álvaro se coloca contra o sistema de escravidão imposto:
“ – A escravidão em si mesma já é uma indignidade, uma úlcera hedionda na face da nação, que a tolera e protege. Por minha parte, nenhum motivo enxergo para levar a esse ponto o respeito por um preconceito absurdo, resultante de um abuso, que nos desonra aos olhos do mundo civilizado”. (P. 94)
Além desse exemplo, temos na narrativa a própria descrição da protagonista Isaura que, apesar de ser branca e a mais linda das mulheres da região, é filha de uma escrava e por esse motivo também é uma escrava. 
De acordo com Alfredo Bosi, Bernardo Guimarães estava mais ocupado em narrar sobre as perseguições sofridas pela bela Isaura pela cobiça de um senhor vilão que reconstruir as misérias de um regime servil. Apesar desses diálogos contra a escravidão e as distinções de cor, toda a beleza de Isaura é colocada na sua cor nívea, branca, distante da cor estigmatizada do escravo.
Nesse ponto, o autor deixou de abordar em seu romance a real condição do negro e todas as misérias sofridas por essa raça. Ao contrário do que realizou Castro Alves que se utilizou de seus poemas para denunciar os horrores da escravidão, promovendo uma Literatura preocupada com as questões sociais de sua época.

Segundo Bosi, “O que explica a beleza ‘branca’ de Isaura é a permanência dos padrões estéticos europeus.


A FIGURA DA MULHER NO ROMANCE:
A protagonista Isaura pode ser analisada a partir de dois aspectos: Isaura – escrava e Isaura-mulher.
Na Isaura-escrava temos uma mulher conformada com a sua condição de escrava, submissa aos seus senhores. Na Isaura-mulher temos, mais uma vez, uma mulher submissa ao universo masculino, cuja educação foi baseada na educação das demais moças da época, ou seja, criada para cuidar do lar, do marido e dos filhos.
“(…) Posto que criada na sala e empregada quase sempre em trabalhos delicados, todavia era ela hábil em todo o gênero de serviço doméstico: sabia fiar, tecer, lavar, engomar, e cozinhar tão bem ou melhor do que qualquer outra”. (p.41)
Desse modo, o romance mostra de que maneira a figura feminina é duplamente inferiorizada em relação ao homem, ao seu senhor. Isaura é escrava, dentro de um sistema escravocrata, aceito pela sociedade em geral com naturalidade. Ao mesmo tempo, é submetida a uma educação refinada, na casa grande, como devem ser todas as filhas de senhores de escravos, fazendeiros ricos e poderosos; recebe, então, o rótulo da mulher branca.
A partir desses aspectos, podemos perceber a dualidade da figura da mulher na sociedade imperialista em que o elemento masculino é dominante. Também é possível perceber a impossibilidade de liberdade da mulher que, mesmo livre dos grilhões de sua cor, que no caso de Isaura não faz diferença, pois há a sua descendência negra, ainda é cativa de um sistema social que aprisiona a mulher ao confinamento do lar e à servidão ao esposo.
“À medida que a menina foi crescendo e entrando em idade de aprender, foi-lhe ela mesma ensinando a ler e escrever, coser e a rezar. Mais tarde procurou-lhe também mestres da música, de dança, de italiano, de francês, de desenho, comprou-lhe livros, e empenhou-se enfim em dar à menina a mais esmerada e fina educação, como faria para uma filha querida. Isaura, por sua parte, não só pelo desenvolvimento de suas graças e atrativos corporais, como pelos rápidos progressos de sua viva e robusta inteligência, foi muito além das mais exageradas esperanças da excelente velha, a qual em vista de tão felizes e brilhantes resultados, cada vez mais se comprazia em lapidar e polir aquela joia que ela dizia ser a pérola entrançada em seus cabelos brancos.” (p. 17)

REGIONALISMO DE BERNARDO GUIMARÃES
O autor foi criticado por Monteiro Lobato, que “dizia que o escritor romântico não reproduzia fielmente as paisagens e personagens da roça: “Bernardo descreve a natureza como um cego que ouvisse cantar e reproduzisse as paisagens com os qualificativos surrados do mau contador. Não existe nele o vinco enérgico da impressão pessoal. (…) Bernardo falsifica o nosso mato”.
Essa “falsificação” deve-se, talvez, ao caráter romântico do autor, preso à idealização.
“As obras mais lidas de Bernardo Guimarães, O Seminarista e A Escrava Isaura, devem sua popularidade menos a um progresso na fabulação ou no traçado das personagens do que à garra dos problemas explícitos: o celibato clerical, no primeiro, a escravidão no segundo.”*
*BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. São Paulo, Cultrix, 36ª edição,1999.

BIBLIOGRAFIA
BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. São Paulo, Cultrix, 36ª edição,1999.
GUIMARÃES, Bernardo. A Escrava Isaura. São Paulo, Editora Ática, 17ª edição,1991.